Passado envelhecido ( XII )

Mais uns goles e estava pronto pra próxima. Sônia, uma mulher que me deu por três minutos e sumiu. Minha culpa, fiquei tão excitado que não fiz esforço algum pra segurar, deixando ela puta, com toda razão. Foi embora me chamando de precoce mestre, falei ainda pra esperar a próxima, mas ficou tão injuriada que me mandou apostar corrida com um pacote de macarrão instantâneo, gritei atrás dela que apostaria e ganharia facilmente. Eu já tinha dado algumas das piores fodas da história pra algumas mulheres, não era Sônia que iria me parar. Ainda tentei ligar alguns dias depois, mas não atendeu, e agora tentaria novamente. Disquei e nada. Disquei de novo, de novo, de novo e nada. Sequei um copo de vinho, se atendesse seria uma conversa delicada. Fiquei imaginando um pouco:
“Alô”
“Oi. Sônia?”
“Sim, quem fala?”
“Ramon, lembra?”
“Você fala muito rápido. Não entendi”
“R-a-m-o-n”
“Ah! O miojinho”

Mais um pouco:

“Oi”
“Oi Soninha, tudo bem?”
“Tudo. Eu te conheço?”
“É o Ramon”
“Ah! Não tive tempo de conhecer”

E a última vez:

“Alô”
“Sônia?”
“Sim! E você?”
“Aqui é o Ramon”
“E aí?! Batendo muitos recordes?”

Parei de imaginar e liguei de novo, dessa vez ela atendeu, o que me surpreendeu.
– Alô – ouvi.
– Oi. Sônia?!
– Isso. Quem está falando?”
Pensei seriamente em desligar. Falar meu nome traria muita decepção à conversa. Subitamente me veio a ideia de instigar ela mesma a falar, pra expulsar pelas cordas vocais o Ramon precoce mestre que existia dentro dela, talvez isso mudasse o rumo do nosso papo.
– Não lembra de mim? Perguntei.
– Não. Quem é você?
– Daquele dia do bar. Que saímos e fomos lá em casa, no São Pedro.
– Já fui na casa de muitos caras no São Pedro. Vai ter que ser mais específico.
– Naquela ruazinha escura e de morro íngreme.
– Não estou lembrada. O que você quer?
– Quero que você venha conhecer minha casa nova.
– Mas me fala seu nome. Quero saber com quem falo.
– Aquele alto e barbudo. Que não parava de tossir.
– Por que não me fala seu nome logo?
– Quero saber se fui inesquecível pra você.
– Pelo jeito não. A gente transou?
– Por horas.
– Bom, não estou lembrada. Vou desligar. Tchau.
– Espera aí!
– Diga.
– Aquela casa com um espelho na porta pelo lado de fora. Você olhou seu cabelo bastante tempo nele antes de entrar.
– Huummmm. Acho que estou lembrando. Aquela quitinete que tinha um sofá-cama no meio da sala e uma escada pro segundo andar?
– Isso, isso.
– Eu estava muito bêbada aquela noite. Não lembro seu nome. Pode me dizer?
– Começa com R.
– Pô cara! Tu é chato né. Vou desligar agora se não me disser teu nome.
– Sua besta bêbada. Meu nome é Ramon, o que quase gozou antes de endurecer o pau.
Ela desligou. Parei de ligar.
Olhei pro relógio, eram dez horas da noite, eu estava bêbado, e as páginas continuavam brancas. Escrevi uma frase em cada página pra finalizar o caderno, com muita dificuldade ainda. Lá estava Ramon, um dos piores escritores do mundo, bebendo e fumando como se fosse um dos bons.

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