Se eu visse um ipê florido
Na frente de outro ipê florido
Ao lado de outro ipê devastado
Se eu visse uma floresta iluminada pela metade
Com uma antena em seu corpo beijando o céu
Casas desbotadas ainda querendo amá-la
Com janelas e portas abertas
O homem glorificando sua única natureza
Se eu visse roupas coloridas no varal da mulher de cabelos verdes
Ou um pneu furado no carro amarelo do jovem careca
Eles dariam um ótimo casal, se eu visse
E se eu visse cortinas balançando em um porão abandonado
Algumas mariposas grudadas nas paredes mofadas de julho
Se eu plantasse um ipê na frente desse porão
E convidasse a mulher de cabelos verdes e o jovem careca para um jantar
Mariposas alho e óleo, uma cerveja preta pra cada
Se eu continuasse cego, ainda teria tempo para ouvir o rádio desligado
Se eu ouvisse uma velha de braço engessado contar uma piada para seu cão
E se ele risse ao mijar no poste e errar o alvo
Se eu escutasse uma pedra quebrar o telhado e alguns pássaros saíssem voando pelo buraco
E se o lavador de telhados não visse o buraco e caísse dentro
Se eu fosse borracheiro e estivesse trocando o pneu do jovem careca
Enquanto ele roubava algumas roupas coloridas do varal da mulher de cabelos verdes
E se o lavador de telhados fosse filho da velha de braço engessado
E se fosse marido, e se ele tivesse inventado a piada
Se o cão latisse
E se eu continuasse
Não estaria aqui
Onde?