Personagem faz um lance. Plic. Prossegue o diálogo.
– Se era o melhor da equipe não deveria ter parado. Ligar uma moto qualquer um consegue, agora ser um bom jogador de xadrez é muito difícil.
– Fazer o quê?! Quero ser um qualquer. Essa disparidade fictícia entre pessoas não me interessa. Se nascer um jegue azul, os humanos acham extraordinário, mas para os outros jegues é simplesmente um jegue. Disso que estou falando, penso como um jegue. Pra finalizar esse assunto meu caro, experimente somente um dia amarrar três molas de caminhão nos pedais de uma moto e sair andando.
Plic.
– Não entendi o que quis dizer, mas enfim. Chegou a jogar contra atletas de nível internacional?
– Sim, se não me engano foram três.
– Vou pensar um pouco para o próximo lance. Depois continuo o assunto.
– Certo. Vou até ali comprar uma rapadura. Quer também?
– Não, obrigado.
O personagem sai do palco, fica somente a criança e a mesa com o tabuleiro. Ela vai circulando a mesa deslumbrada, se aproxima e logo se afasta. Até que finalmente senta no banco do adversário imaginário. Ela pega peça por peça que alcança e analisa fascinada. (projetar o fundo novamente com a imagem do tabuleiro visto de cima). Após analisar bem a peça ela da umas gargalhadas regozijantes, e devolve a peça ao tabuleiro, algumas em posições diferentes de onde estavam. O fundo com o tabuleiro desaparece. A criança se levanta e vai sentar no banco do personagem. Pega somente um cavalo branco e começa a brincar com ele, fazendo-o cavalgar em cima da mesa. Desce do banco e faz ele cavalgar pelo chão.
O morador passa pelo fundo declamando esse poema:
Apesar,
As cores de um jardim calado
Entorpecem a aranha careca
As teias da subordinação são grossas
Como os caules da esperança
Insano cortejo da bilheteria
Seguindo um vestígio de soro marcado
A ferro, fogo, sintonia, artifícios
Tabaco, álcool, solventes, histeria
Coalhado, calado, qual lado
A corda estica?
Apesar,
Do sujo olhar do beija-flor
A pergunta é feita pelo Doutor M.
Flocos de madeira cristalizados
Caem sobre as sombras das viúvas ancestrais
Os bonecos de pedra sugam o descompasso
E equilibram a primavera abrindo a porta
Paro, a pesar
O nó da corda
Uma desobediência desiludida
Calcando a perfeição
No último minuto do relógio