Já na outra manhã tive êxito em matar. 7:45, um cigarro na mão direita, pensamentos e passos apressados com minhas pernas longas. Vindo em minha direção na calçada que delimita a entrada no matagal, há uns vinte metros, um homem de terno com uma mochila nas costas e fones nos ouvidos. Uma moça de bicicleta estava parada na ciclovia que separa a calçada da avenida no mundo com câimbra, procurando algo em sua bolsa. Ouvi um barulho alto de motor passando, era uma kombi branca. Vi que a moça retirou uma água da bolsa e dava goles desesperados. Parei perto dela e perguntei:
– Quer vender a bicicleta?
Ela engoliu o que tinha na boca e disse:
– Não. Tem um cigarro sobrando?
– É o último – respondi.
Ela foi e eu fui. Ao me aproximar do homem de terno fiz um sinal que sugeria tirar os fones e me ouvir:
– Quer vender o terno? Perguntei.
– Quero – ele respondeu.
– Quanto você quer por ele?
– R$ 350,00.
– Me diz uma coisa. Se eu cair com esse terno aqui na calçada ou dentro do mato, vai rasgar?
– Depende. Quanto você pesa?
– 82 quilos. Perdi um quilo essa noite.
– Esse terno aguenta uma queda na calçada sem danificar vestido numa pessoa de até 95 quilos. No mato até 87 quilos não rasga.
– E se eu engordar seis quilos?
– Melhor cair na calçada.
– E se eu engordar quatorze quilos?
– Não caia mais.
– Costumo cair vestindo terno mais no mato. Quero testar antes de comprar. Posso vestir e cair aqui ao lado?
– Claro.
Caminhamos um pouco até encontrar uma abertura na mata. Ofereci um cigarro.
– Não fumo – ele disse.
Três minutos pela trilha até pararmos. Vesti o terno que usava enquanto ele retirou da mochila outro terno e o vestiu também.
– Quer vender esse terno? Perguntei. Gostei mais desse que está usando agora.
– Esse não vendo.
– Por quê?
– Pois sua capacidade/quilo de não danificar em uma queda na calçada ou no mato é maior.
– Qual exatamente?
– Na calçada 110 quilos. No mato até 97 quilos.
– E como você sabe dessas capacidades/quilos dos ternos?
– Acho que li na garantia.
– E se por acaso um cachorro me morder? Vai rasgar?
– Te morder na calçada ou no mato?
– Na calçada.
– Vai depender do peso do animal.
– E no mato?
– Qual mato?
– Nesse.
– Nesse não vai rasgar.
– Entendi – falei. Mas não entendi. – Agora vou testar o terno.
Dei uns dez passos para trás enquanto ele observava.
– Vou fingir que corro de um cachorro em um daqueles matos, que segundo você, a mordida acabaria com minha roupa. Quando eu chegar perto de você me jogarei no chão simulando um tombo. Se não rasgar lhe pago R$ 400,00. Se rasgar, lhe pago R$ 350,00 independente do estado que ficar.
– Amigo, você não estaria ganhando nada com essa proposta – ele disse. R$ 350,00 é o valor que quero dele, assim como está.
– Mas terei uma boa ideia da velocidade que posso alcançar fugindo de um cachorro, sem riscos.
– Fechado então – ele disse.
Disparei em alta velocidade nos dez passos de distancia dele, e ao invés de simular um tombo, acertei-lhe um soco direto na cara. O desgraçado saiu rolando na trilha, desmaiado, e só parou quando seu corpo mole esbarrou em uma árvore. Senti vontade de mijar e fiz isso na cara dele. Nem reagiu. Balancei o pau e umas gotas ainda caíram sobre seus olhos. Percebi um pequeno rasgo em seu terno, além de um botão danificado. Ainda bem que tinha garantia. Bati sua cabeça na árvore até abrir uma fenda larga na testa. Deixei-o com seus dois ternos e fui trabalhar. Cheguei ás 8:00 em ponto, sem sangue nas mãos. Bebi um bom café.