Passado envelhecido ( XXIII )

Eram nove horas da noite, ou quase isso, perto disso, pela escuridão do quarto imaginei nove horas, mas não eram. Eu já dormia exaurido, sonhava que estava morto, mas, ainda acordado movia os olhos. Morto e pelado, no próprio colchão, tentava descobrir como havia morrido nu. Sinais. Chovia muito e uma goteira acertava minha testa em cheio. A gota descia pelo nariz e contornava a boca. Uma gota quente, mais sinais. Descia pelo meu peito cabeludo e entrava em meu umbigo. Doía, mas eu estava morto, pelado e molhado. Mais uma gota na testa percorrendo o mesmo caminho. Mais dor, mais morte, mais sinais. Menos com menos é menos negativo? Não, é mais, eu disse.
O telefone tocou, imaginei que eram nove horas, ou perto disso. Bebi algumas antes de deitar, ou melhor, bebi deitado antes de dormir, e essa talvez fosse a explicação de estar pelado, molhado e morto. Pensei: Se for deus estou ocupado, se for o diabo estou bêbado. O som do aparelho sacudia meus pés toda vez que cantava, como vibrações de orgasmos caindo do teto. Com um poder rasgado em meu túmulo, percebi que nem deus, nem o diabo insistiriam tanto em falar comigo. Mais uma gota na testa, mas essa nem percorreu meu corpo, ficou zanzando sobre minha cabeça, alfinetando como agulhas de acupuntura da grossura de um prego 18×36. Sinais e sons. Finalmente consegui atender.
– Sim – falei.
– Sim o quê? Ela perguntou.
– Sim, morri.
– Estou grávida.
– Por quê?
– Está bêbado?
– Não, morto.
– Fiz o teste hoje pela manhã. Dois risquinhos. O filho é seu.
– Não é.
– Só dei pra ti esse mês.
– Não deu.
– Vai assumir?
– Sim.
– Está com medo?
– Menos com menos é menos negativo.
Não ouvi mais nada.
Acordei pelado e com dor de cabeça. Tomei um omeprazol e uma dipirona. Achei minha cueca sobre a tampa do vaso sanitário, ao lado de um rolo de papel higiênico perto do fim. Coloquei-a. Preparei-me para o trabalho, calça, sapato e a camiseta da empresa, que pega fogo sozinha. Quando acendi um cigarro na porta, ouvi o telefone. Não atendi. Suei e fedi o dia inteiro. Voltei pra casa para um perfeito banho gelado. Senti meus mamilos duros e brinquei com eles, cutucando-os com o dedo indicador da mão direita. Lavei principalmente minhas virilhas. Exaurido novamente deitei para dormir um pouco, era quase sete horas da noite, ou quase isso pensei, pela claridade do quarto, mas não era. Conferi, vestia uma cueca, então fechei os olhos.
Não sei quanto tempo passou até ouvir batidas na porta, lentas como páginas viradas. Conferi, ainda estava de cueca, levantei-me e fui ver quem era. A chave está sempre jogada em um pote com moedas e um frasco de omeprazol. Tomei uma pílula sem água. Toc….Toc…..Toc. Gub, gub, engoli com dificuldade, pensei que o remédio pudesse ter ido parar em algum pulmão, então seria o fim da minha azia asmática. Abri a porta com uma moeda, eu tinha engolido a chave. Sem sinais por enquanto. Quem batia era uma criança com a cara borrada. Olho para o céu, vejo nuvens brancas estáticas, todas no mesmo formato.
– Gostosuras? Pergunta a criança.
Tenho uma bala de banana na mão, lhe entrego. Sinais. É uma menina, como eu sei? Eu não sei.
– Gostosuras? Ela continua.
– Menos com menos é menos negativo – lhe digo.
– Não, é mais – ela corrige.
Dou-lhe outra bala de banana. Odeio balas de banana.
– Por que você tem cara de sabonete? Pergunto.
– Porque o mundo é sujo – ela responde e some.
Tranco a porta com uma pílula, pois engoli a moeda. Volto ao colchão e deito, ainda estou de cueca. O telefone toca. Não sei que horas são. Deduzo que estou louco, e loucos não se importam com as horas. Eram dez, pelo menos quase isso, podia apostar uma bala de banana, mas não tinha mais, nunca tive. Pensei: se for deus é engano, se for o diabo é a cobrar. Levanto o braço direito e alcanço o interruptor, ligo, desligo, ligo, desligo, nada muda. Vivia tanto no escuro que nem percebia quando faltava luz. Encontro o telefone, antes de atender confiro, estou de cueca.
– Alô – atendo.
– Te liguei hoje de manhã, mas não atendeu – ela diz.
– Ninguém me ligou. Ninguém me liga.
– Eu liguei.
– Não ligou.
– Tenho certeza que liguei.
– O que você quer? Pergunto.
– Prefere menino ou menina?
– Menina.
– Por quê?
– Porque o mundo é sujo e menos com menos é mais.
– Vai assumir?
– Vou, porra!
– Você será um péssimo pai. Pelo menos é bonito, quero teus olhos no menino e minha bunda na menina.
– Que horas são?
– Quase dez.
– Sabia. Ganhei a aposta.
– Qual aposta?
– Bobagem. Quero saber. Quem é você?
Não ouvi mais nada.
Acordei bem disposto. Pus minha calça, meus sapatos e minha camiseta da empresa com um bordado na parte esquerda no peito, em círculo, verde e branco. Quase esqueci do omeprazol, mas lembrei-me ao catar a chave no pote. Juntei algumas moedas para comprar cigarros, a carteira pesava e fazia sons a cada passo, como se eu tivesse uma capelinha de santa na bunda. Trabalhei como sempre, suando e encharcando a cueca e a camiseta. Antes de voltar pra casa fui ao banheiro da empresa. Passei lentamente o dedo indicador da mão direita nas minhas duas virilhas e cheirei. Absurdo. Um banho gelado seria perfeito. Em casa, após quarenta minutos de caminhada, abri as duas únicas janelas fechadas, a do banheiro sempre fica aberta parcialmente. Tirei minhas roupas e larguei em uma bacia branca embaixo do tanque para lavar algum dia doravante. Afastei uma cortina e me posicionei embaixo do chuveiro, girei a torneira até o fim aguardando a mais gelada das águas. Esperei por uns segundos, olhei pra cima, olhei para a torneira, conferi se havia girado toda. Fechei-a e girei toda novamente. Olhei pra cima e nada. Sem água. Passei novamente meu dedo indicador da mão direita pelas virilhas e cheirei. Que absurdo feder assim. Fui até a geladeira e ao abrir a porta acendeu-se a lâmpada, iluminando poucas coisas, mas entre elas, uma garrafa plástica de um litro e meio, com água pela metade. Agarrei-a e voltei para debaixo do chuveiro. Esfreguei o sabonete pela virilha direta e depois, com a mão esquerda em forma de concha cheia de água gelada, derramei e fiz espuma na virilha. Fiz isso também na virilha esquerda, nas axilas e entre as nádegas. Sequei-me e deitei no colchão. Sobrou em torno de oito goles de água na garrafa, podia apostar na quantidade, mas iria perder. Decidi tirar um cochilo. Não conferi a cueca pois decidi dormir pelado. Meu pau endureceu algum tempo depois. Eu estava com o lado direito do corpo apoiado no colchão, minha mão direita segurava belos cabelos longos e castanhos ondulados, minha mão esquerda suspendia uma deliciosa perna esquerda pela dobra do joelho. As vibrações não caíam do teto, emanavam dos genitais siameses em forma de calor e vida. Sinais. Sua bunda corpulenta amaciava o impacto dos nossos corpos cobertos de suor e luxúria. Eu sentia que pegaria fogo dentro dela, meu pau seria cremado sem cerimônias e orações, ou morreria enterrado em uma caverna vulcânica com a lava das deusas promíscuas. Uma sincronia de átomos, beirando o colapso explosivo da carne crua.
– Quanto é menos com menos? Perguntei.
– Menos com menos é sua porra dentro de mim – ela respondeu.
Sinais. Não ouvi mais nada.
O telefone tocou e me acordou no outro dia, vinte minutos antes do horário normal que acordava para ir trabalhar, vinte, ou quase isso.
– Alô – eu disse.
– Oi – ela disse. – Te acordei?
– Sim.
– Me desculpe. Estou com saudades. Faz uns quatro dias que não te vejo. Ando ocupada com meu curso de acupuntura e meu trabalho. Como você está?
– Estou bem.
– Será que podemos nos ver hoje?
– Podemos.
– Esteja aqui as 20:00 hoje. Tenho uma surpresa.
– Está grávida?
– Claro que não, seu besta.
– Estarei aí as 20:00.

Teria que engravidá-la, eu amava a mulher.

Passado envelhecido ( XXII )

– Xeque-mate – disse Vences.
– Tá maluco? Posso mover o Rei pra cá – disse Tomás movimentando a peça.
– Não pode, tem esse bispo aqui atacando essa diagonal – falou Vences segurando o Bispo pelas pontas dos dedos da mão direita. Ele era canhoto, mas segurar as peças com a outra mão lhe proporcionava poder, ou prazer, não sabia distinguir o que sentia ao segurar o bispo com a mão “ruim”. Era como apalpar seios com essa mão, meio atrapalhado, machucando às vezes, mas era possível, considerava seu sexo mais complexo nas dificuldades, sacrificava-se pra utilizar seu corpo inteiro, principalmente as partes mentalmente incapazes. Só assim sentia-se vivo e altivo, humildemente um homem completo fisicamente.
Tomás observou o Bispo nas pontas dos dedos da mão direita de Vences e jurou em silêncio que o depravado ria da situação. Pensou em seu pobre Rei humilhado por um principiante a Papa, e possuiu-se de amargura por ele, pela incompetência intelectual daquela diagonal. Por um instante percebeu a suavidade do Bispo nas alturas, e logo soube, seu adversário era canhoto, exacerbadamente confiante pra fazer aquilo com ele. Tomás era um destro fortemente armado, um soco seu de direita derrubaria um avião. Utilizava da mão esquerda somente para lavar a direita nas tantas pias do mundo. Em certa ocasião tentou limpar a bunda com a mão esquerda, mas a bunda rejeitou o movimento grosseiro, seu ser inteiro sacudiu, proporcionando até um pulinho de negação. O que era ele? Um ser divisível? Sim, podiam cortar todo seu lado esquerdo fora. Teve certeza disso ao tentar masturbar-se com a mão esquerda por três horas. Nada de ritmo, somente puxadas doloridas no couro, capazes de rasgá-lo sem uma miserável ejaculação. Também escovou os dentes com a mão esquerda quatro vezes, mas parou, pois morrer de hemorragia bucal parecia idiota demais. Desistiu de seu lado esquerdo, mas não da partida de xadrez.
– Acho que você não esperava por esse lance Vences! Disse voltando o Rei para casa original com a mão polivalente e avançando um peão para tapar o xeque.
Vences teve pena de seu adversário singularmente incompleto fisicamente. Pensou que ao serrar o lado direito de Tomás, possivelmente o mesmo morreria de fome ou sede. Ao contrário do que acabara de ouvir, era claro que esperava aquele lance. Vences não dizia “xeque-mate” em vão. Assim como não dizia “gozei” em vão, nem “te amo” ou “vi um OVNI”. Com a mão “ruim” elevou o outro Bispo, posicionado na casinha ao lado do anterior na sacristia preta e branca chamada tabuleiro e disse:
– Não pode mover esse peão, está cravado “Tomenos”.
– Que religião está criando Vences? Pra todo lado têm Bispos.
– A religião dos ambidestros ocasionais.
– Não poderei fazer parte, querido amigo.
– É uma questão de perseverança. Se sentirá muito mais completo na minha religião. Poderá escolher com qual mão raspar o saco, até mesmo com qual mão descascar uma laranja ou deslacrar uma cerveja.
Tomás não desistia da partida. Voltou o peão cravado para a posição original e fez o roque grande, tudo com a mesma mão firme.
– O que achou dessa Vences?! Lance de mestre.
– Você não pode rocar estando em xeque. Perdeu. Deixa de lengalenga.
– Quem criou as regras desse jogo? Esbravejou Tomás, mais com o lado direito da boca.
– Eu – respondeu Vences com desdém, movendo a boca em sincronia.
– E se eu te der xeque também?! Persistiu.
– Teu Rei já está em xeque, porra.
– Xeque por xeque e ficamos sem fundos – riram.
– Fecha a boca animal. Arruma as peças e vamos pra próxima humilhação.
– Chega dessa merda. Que tal outro jogo?
– O que sugere?
– Queda de braço com os braços esquerdos.
– Você não consegue abrir uma carteira com a mão esquerda.

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A sambiqueira tornou-se souvenir
Na boca da rainha de copas
Metabolismo de avestruz
A desmanchar mel no canto da boca
Aleluia no gelo, Aleluia na porta do quarto
Sublime rasante enfeitando e enfeitiçando
Uma sala de ostras hipnotizadas
Lá de fora o uivo e o canto do vento sempre a destacar
O som das calhas soltas pelos uivos e pelos cantos
Horizonte espremido verticalmente
Logo acima do rodapé
Pela ausência de blefes genuínos
Ergo o copo cheio de vinho
E proponho um brinde:
“Bom, estarei lá
Daqui um minuto
Será a mesma coisa
Eu estive lá
Vinte anos atrás
E foi a mesma coisa
Estou lá
Agora
Mesma coisa
Será possível não estar?”
Eles me ignoram
E dizem que,
Recentemente um poeta grisalho e viúvo
Costumava passar gritando por aquelas ruas todos os dias:
“Eu escrevi o poema mais sincero do mundo”
E corria com a folha de papel até cansar
Depois acendia um cigarro
E queimava as palavras mais sinceras do mundo
Perguntei se ele ainda fazia isso
Mas o velho poeta havia cometido suicídio
Dentro do banheiro, e ninguém nunca se atreveu
Procurar uma cópia do tal poema
Falei que iria lá depois de terminar o próximo copo
Ignoraram-me
Caminhei por uma quadra inteira
Até encontrar a casa, cheia de arbustos até a entrada
O cheiro, o silêncio, as cores, tudo neutro
Vasculhei algumas gavetas
Prateleiras, revirei alguns livros
Até achar um caderno surrado e um lápis
Por baixo de uma coleção de cartões postais
Folheei todas as páginas
E em torno de trinta delas estava escrito:
“Eu escrevi o poema mais sincero do mundo”
Algumas estavam em branco, e dava pra ver
Que muitas haviam sido arrancadas
Peguei o lápis e fui até o local da morte
Escrevi na parede branca
“Olhei pela janela do banheiro
Alguém estendia calcinhas
Outro paparicava o papagaio
A moto não pegava de jeito nenhum
O muro foi pichado novamente
Fechei a janela
Abri o chuveiro
E com o sabonete
Rabisquei meu nome no vidro
Pois entendi que essa janela
É um poema que posso lê-lo
De formas diferentes todos os dias
E encerrá-lo quando quiser
Só depende do movimento dos meus olhos
E de um movimento de mão”
Espero
Que se alguém for lá
Procurar o poema mais sincero do mundo
Não pense que foi isso que ele tanto escondeu

Passado envelhecido ( XXI )

Na fila do banco pra retirar o PIS, Eduardo, também conhecido por Dudu Doidão escuta uma velha de cabelos pintados de azul reclamando “Tão passando maionese nas notas?”. Dudu acha engraçado, sai da fila e se aproxima pra ouvi-la. “Estão rezando nessa merda?”. Cutuca a velha, quer emoção, ser xingado também. “Hei senhora, sabe onde vou para ver em qual dia recebo meu PIS?”, “Mas como que eu vou saber cretino?”, “Sabe de uma coisa, gostei do seu cabelo, são naturais?”, “Porra, você é burro mesmo né jovem”. Eduardo já tinha 29 anos, desde os quinze já era louco, enfiava um dedo no cu de galinhas, arrodeava, tirava, enfiava outro, arrodeava, depois enfiava os dois e cuspia na cara delas. Conseguiu um emprego de coveiro, e quando podia passava seus dedos nos mortos, é apaixonado pelo cheiro deles. Sussurra no ouvido da velha: “Teu cuzinho é azul também?”, “HEIIII, CADE A POLICIA, ESTOU SENDO ASSEDIADA, ESSE MALUCO QUER VER MEU CU!”. Todos olham, o clima fica tenso. “HEI, NÃO LIGUEM! MINHA VÓ TÁ DOIDA! Relaxa aí vó.“NÃO SOU SUA VÓ, CADE A POLICIA? TIREM ESSE CARA DAQUI! QUER VER MEU CU!!”. Um segurança do banco vem na direção deles,  ele volta pro final da fila. Os dois conversam, ela aponta pra Dudu, que segura uma gargalhada. O segurança é barrigudo, usa boné, tem uma fisionomia que lembra seu tio favorito, o Milton. O banhento ouve a velha e se dirige até Dudu. “Podemos conversar ali fora um pouco camarada?”, “Claro seu guarda”. Saem do banco.“O que aconteceu com aquela senhora? Ela me disse que o senhor a desrespeitou, chamou-a de vó, e queria ver seu cu azul”, “Nada disso. Fui perguntar se ela sabia onde eu poderia ver a data do PIS. Ela me chamou de cretino. Aí falei que gostei do seu cabelo, e perguntei se seu xampu era azul também. Ela surtou”.“E por que chamou ela de sua vó?”,“Pros outros não pensarem que eu sou um tarado por pele velha”, “Amigo, é melhor o senhor ir em outra agência, pra evitar qualquer coisa. Ou então espere ela sair e volte. Ok?”,“Ok”. Dudu dá uns vinte passos, fica na espreita, com um cigarro na mão. O clone do seu tio Milton observa, com aquela cara de sapo morto e barriga pra cima. Eduardo dá mais trinta passos, contando lajotas, sai fora do campo de visão, se escorra num fusca alaranjado, o qual lembra o carro do seu tio mais ordinário, o Elói sorveteiro. Esse tio foi o único que o pegou na farra com as galinhas. “Heii Eduardo, o que você ta fazendo com minhas galinhas?”, “To tirando os ovos tio!”, “Seu perturbado, você tá cuspindo na cara delas”. Dudu atirou uma pedra no tio, pegou na canela, e recebeu uma bergamotada na nuca. Nunca mais se falaram. Depois de quinze minutos, a velha sai do banco gesticulando com as árvores, com um maço de notas nas mãos, vai pro mesmo lado que o Doidão. “Hei vovó”, “SEU CRETINO! CADE A POLICIA? ESSE CARA TA ME SEGUINDO! ALGUÉM ME AJUDE”, “Sua velha safada, cala essa maldita boca antes que te quebro as pernas”, “ALGUÉM..”. Dudu movimenta os braços como quem vai pegar uma arma e fala calmamente: “ Escuta aqui sua galinha, se gritar novamente, eu acabo com você aqui mesmo. Eu não perco nada, sabe por quê? Vou alegar insanidade, já passei por mais de trinta psicólogos e psiquiatras, eles vão confirmar, e serei mandando para um hospício, onde chuparei tetas malucas. Você vai morrer com esse maço de dinheiro nas mãos, vou te chamar de prostituta enquanto seu sangue fedido escorre por aí. “O que você quer?”, “Quero ver a cor do seu cu. Você acha loucura? Todos querem saber, suas filhas, suas amigas, seus cachorros, seu médico de hemorroidas, as moscas amarelas, todos!”, “Meu jovem, você nunca esteve na cama com uma mulher de cabelo pintado?”, “Uma única vez, mas estava escuro, dei uma lambida, tinha um gosto diferente, quando acordei no outro dia, ela já tinha ido embora”. “Pois bem querido, eu não vou te mostrar o que você quer, mas garanto que é igual o seu”, “Sinto muito vovó, terei que matá-la então. Preserve o cu lá no inferno”. Fez um gesto, simulando sacar a arma. “Tá bom, tá bom, eu mostro”. Dudu segurou outra gargalhada. “Ok vovó. Vira de costas e abaixa essas roupas velhas”, “Você quer ver aqui? Pode passar alguém”, “Não me importo, sou maluco, guardo uma bala de revolver há cinco anos na cueca, bem embaixo dos testículos, eu me dou um tiro na cabeça, vocês pensam: Pobrezinho, tão jovem. Eu te mato e eles dizem: Pobrezinha, uma pessoa tão boa. Cansei, tu não merece nada além de mostarda no rabo. Abaixa logo”.Ela guarda as notas na bolsa, se posiciona na frente dele, e lentamente relaxa as pernas, deslizando as peças íntimas, só a parte de trás, até o fim da bunda. Eduardo não para de rir, enfia um dedo dentro da velha, arrodeia, e cospe na cara dela, aquele muco escorre pela bochecha direita. Ela não se segura e começa chorar. Escuta o estouro, ergue as calças, olha pra trás. Retira uma nota de dois reais e joga no corpo imóvel.

Passado envelhecido ( XX )

Eu já sabia que tinha AIDS. Minhas calças ficaram folgadas, suava todas as noites e não conseguia dormir. Comia pouco e estava todo amarelo. Inicialmente pensei que tinha contraído nos milhares exames de sangue que fiz desde a infância, cerca de dois por mês. Nenhum médico me curava. Minha mãe rezava pela cura. Para não deixarem ela sem resposta, todos afirmavam ao verem meus exames:

– É anemia. Ele tem que comer fígado.

Receitavam alguns remédios, uma lista com alimentos ricos em ferro e marcavam o próximo exame de sangue. E sem brincadeira, devo ter ficado nessa por no mínimo dez anos. Era fígado a milanesa, fígado com limão, fígado com fígado, batida de fígado, suco de fígado, sobremesa de fígado, sorvete de fígado, bala de fígado. Meu pai sempre que podia fumava cigarros de fígado ao meu lado, o que de fato me transformava em um “fumante de ferro passivo”, e concordo, a expressão pode ter uma conotação maliciosa, mas fodam-se, o escritor sou eu.
Passavam-se os dias até a próxima consulta, e lá estava o diagnóstico:

– É anemia. A senhora está dando fígado pra esse guri comer?
– Sim doutor – minha mãe dizia. – É fígado no café, no almoço e na janta.
– Tem certeza que não são fígados de animais alcoólatras?
– Sim. Sempre alerto o açougueiro.
– Estão fumando cigarros de fígado ao lado dele como receitei?
– Sim doutor.
– Muito bem. Vamos tentar outra coisa. Ao invés de usar sabonete, ele tomará banho com um pedaço de fígado durante o período de um mês.
– Fígado de porco ou de boi?
– Pro banho eu sugiro o de boi. O de porco sugiro como travesseiro, também pelo período de um mês.
– Tudo bem doutor. Ouviu filho? Boi no banho, porco na cama.
– Entendido – respondi.
Saímos do consultório e fomos direto para o açougue.
– Oi Tião – cumprimentou minha mãe. Preciso de um fígado de boi não alcoólatra, e um de porco, também não alcoólatra.
– Desculpe senhora – disse o Tião. Hoje só tenho fígados que vieram direto do AA (Animais Alcoólatras).
– Como assim Tião?! Meu filho não pode ficar sem banho e sem dormir hoje. Faz parte do tratamento dele.
– Espere um minuto. Vou ligar para o AA.

Tião pegou o telefone e ligou.

– AA, Giana, boa tarde.
– Boa tarde Giana, aqui é o Tião do açougue do Tião.
– Diga Tião.
– Recebi uns fígados aqui de vocês, e gostaria de saber se algum animal recuperou-se do vício antes de morrer?
– Só um minuto Tião, vou verificar a resposta com meu superior. Aguarde na linha por favor.
– Vai verificar com o superior – disse Tião para nós.
– Marcelo! Marcelo!
– Estou indo Giana.

– Fala meu amor.
– O Tião está aqui na linha perguntando se tivemos algum caso de reabilitação antes da morte dos animais que lhe enviamos a última carga de fígados.
– Sim, tivemos. Um boi e dois porcos não bebiam mais por no mínimo dois anos. Morreram sob nossa observação, por outras causas. Um porco cometeu suicídio, o outro morreu de orgasmos múltiplos na masturbação e o boi, coitado, descobriu que era capado e morreu de tristeza.
– Quais eram os nomes deles?
– Tenório, Valente e Tibúrcio.
– Só um minuto Marcelo.

– Tião?!
– Sim?!
– Tivemos três casos de reabilitação, dois porcos e um boi. Tenório, Valente e Tibúrcio não bebiam mais por no mínimo dois anos. Morreram por outras causas.
– Morreram de que?
– Um porco se matou, outro se perdeu na bronha e o boi foi de tristeza.
– De tristeza?
– Sim, tristeza. Descobriu que era capado.
– Como descobriu?
– Só um minuto.

– Marcelo, como o boi descobriu que era capado?
– Eu contei.

– Alguém contou Tião.
– Ok Giana. Obrigado.

– Por que você revelou que ele era capado Marcelo?
– Porque o animal me chamou de corno e disse que era o pai da minha filha.

Tião explanou a situação. Minha mãe aceitou os fígados. Eu afirmei que os porcos sim sabiam morrer. Fomos pra casa, já estava escurecendo. Meu pai fumava um cigarro de pulmão na cozinha. Minha mãe ficou furiosa, “Você tem que comprar os de fígado, homem!” ela disse. Mas ele comprou aquele porque estava com dificuldades pra respirar. Fui ver TV enquanto a mãe colocava um pedaço do fígado de boi na saboneteira e trocava meu travesseiro pelo fígado de porco.

– Vai tomar banho! Ouvi logo depois.

Entrei no banheiro, liguei o chuveiro e enxaguei os cabelos. Após isso esfreguei a carne pelo couro cabeludo. Imaginei que após aquilo jamais ficaria careca. Foi um banho normal, a única diferença que sentia era quando passava aquela carne macia pelo genital. Não arrisquei lavar a bunda com aquilo, pois seguindo com as conotações maliciosas, meu rabo não precisava de ferro. Saí do banho e fui me vestir.

– Quer jantar? Ouvi da cozinha.
– O que você fez hoje mãe?
– Sopa de fígado pra ti.
– Sim. Já estou indo – respondi.

Na hora de dormir fiquei na dúvida se aquele travesseiro novo era do porco suicida ou do masturbador compulsivo. Fiquei na dúvida. Após os trinta dias de tratamento e mais um exame de sangue retornamos ao mesmo médico.

– Não pode ser – ele disse.
– O que foi doutor? Perguntou minha mãe.
– Esse guri não melhora nunca. Fizeram exatamente o que mandei?
– Nada diferente do que o senhor mandou.
– Bem, só me resta uma última tentativa. Ele terá que comer pregos.

Depois desse dia toda minha alimentação mudou. Virou prego à milanesa, prego com limão, prego com prego, batida de prego, suco de prego, sobremesa de prego, sorvete de prego, bala de prego. Meu pai até que tentou acender alguns pregos ao meu lado. Aquela coisa de comer prego e cagar parafuso não funcionava comigo. Eu sabia que estavam me tratando de alguma coisa, mas nem imaginava o que era anemia. Um tempo depois dessa dieta fui fazer mais um exame para a próxima consulta.

– Desisto – disse o médico.
– Nada mudou doutor? Perguntou minha mãe.
– Absolutamente nada.
– O que podemos fazer pelo meu filho?
– Sinto muito senhora. É um caso perdido.

Minha mãe não desistiu e foi novamente à procura de outro médico. Levamos todos meus exames. Ele era descendente oriental, e o que isso tem a ver? Nada, mas o escritor sou eu. Esse médico ia analisando a pilha de exames sem mexer um nervo do rosto.

– Esse garoto nunca será curado da anemia! Por fim declarou e gargalhou.

Aceitei com minha cara amarela o veredicto. O que seria anemia?

– Não me diga uma coisa dessa doutor. Vou fazer esse guri comer uma patrola se for preciso.
– Esse garoto pode comer pregos pela vida inteira e nada vai mudar! Hahaha.
– Como não?!
– Minha senhora, teu filho nasceu com Talassemia.

Não perderei tempo explicando minha doença hereditária. Acontece que eu sabia que tinha AIDS. Aquelas malditas putas não esterilizavam as agulhas ou teria sido aquelas outras putas? Não importava, iria morrer logo. Feridas amadureceram perto do pau. Tive esperança de não ser AIDS, apenas alguma DST qualquer, mas logo as feridas sumiram, e novamente eu tinha AIDS. Suei por inúmeras noites, até que finalmente decidi fazer o exame.

Bengala

Preciso tirar o pó
Do escorpião na poeira
Reflexo branco
Caindo aqui dentro
Da janela do vizinho
Tento fechar a cortina constantemente
Mas continua caindo aqui
Iluminando uma linha reta
De praticamente nove centímetros
Até o pé da porta
Ele cruza Gal de Galileu
UL de PULP e a mão no gatilho
A borboleta azul do Novíssimo Testamento
Então percebo parte do recibo do aluguel
Que tanto precisei mês passado
Absorvido sob minal de Germinal
Busco-o pelo carnaval da janela
Fecho a cortina novamente
Lembro daquela rainha verde
Que torcia os velcros sobre a cabeça
Rasgo o recibo em pequenos pedaços
Atiro-os em direção ao ventilador
Quando volto do banheiro
Os nove centímetros como uma muralha lunática
Atingem meus dedos dos pés
Antes de sentar,  observo
Tação de Alimentação
Sento, e aquele sabre incandescente
Serra-me ao meio
Ao mesmo tempo em que me taxa de impotente
Brilhando meu maço de cigarros sobre o estribo
Uma mulher de cabelos cacheados
De bom porte, chega ao quarto vizinho
Eles conversam sobre a morte
De um estrangeiro no bueiro
Depois ela pede para estender as roupas no varal
Da janela
Eu ouço pingos nas telhas
Mas é uma mulher de fibra
Enquanto ela faz seus movimentos
Aquele reflexo que parecia tão contundente
Torna-se um pôr do Sol entre as montanhas
Uma víbora em um balde de ácido
Lanço-lhe um beijo, mas ela não vê
Eles conversam mais um pouco
Sobre o fim do amianto e as cruzadas perdidas
Ela vai embora, enquanto ele ouve uma música
Que também cai aqui dentro
Continuo serrado ao meio
Róis de Faróis, êniev de Turguêniev
Acendo a luz do meu quarto
Baixando a guarda
Mas quando leio que
Os Tigres de bengala
Podem acasalar até cinquenta vezes em um dia
Desligo a luz
E vou beber na cozinha

Passado envelhecido ( XIX )

Essa mulher era um pouco mais velha, bruta mulher, perfumada, peitos erguidos, cintura fina, bunda larga, rosto esbelto, uma presa caçada todo dia, com longos cabelos loiros e mamilos duros, que machucariam a gengiva de qualquer um, e beijava mal pra burro.
O ambiente do bar estava insatisfatório, os poucos presentes eram alguns traficantes, putas caras, músicos conversando sobre seus ídolos do passado, “Jim Morrison foi foda, um poeta, comeu todo mundo, acho que minha mãe daria pra ele”, “Bom mesmo era o Hendrix, toco duas dele, acabou com Jimmy Page e Eric Clapton”, “Porra, eu amo vocês dois, vamos montar uma banda?”, eu soluçando um abominável salame, e essa loira, abandonada, pinta de puta, olhar de puta, pedindo cerveja com outras garrafas pela metade ainda.
Lembro-me de sentar em sua mesa após uma troca de olhares minuciosa, uma prova concreta de algo incerto. Era um sábado de 2011, por volta da meia-noite .
– Posso me sentar? Perguntei
– Fique a vontade.
Puxei a cadeira, pousei minha garrafa. Enchi meu copo e o dela.
– Percebi que você estava gostando de me olhar – continuei.
– Que coisa, percebi o mesmo de ti.
– É, eu gosto de olhar às vezes.
– Acha que eu tenho cara de puta?
– Tem
– Sério? Ainda bem. Mas não sou puta.
– Ainda bem, porque to falido.
Brindamos, demos um gole juntos, eu sequei o copo, pra ela faltou pouco. Enchi de novo.
– Você é charmoso sabia? Tem toda essa barba mal feita. Esse cabelo desajeitado. É alto e magro, mas seus olhos compensam a falta de músculos.
– O que posso dizer? Deus só economizou na coragem.
– Se te falta coragem, como sentou aqui?
– Pensei que fosse puta.
– Mas não tem grana, dá pra ver na cara.
– Iria mentir que sou um piloto de avião. Mas vamos ao que interessa. Esse bar já deu o que tinha. Que tal irmos lá em casa ouvir um som decente e beber um punhado? Se bobear, tem até sanduíches de frango na geladeira.
– Onde você mora?
– Vinte minutos a pé.
– Eu moro aqui do lado. Pode ser na minha casa?
– Tem cerveja lá?
– Tem umas três. Compramos mais umas aqui.
Ela se vestia muito bem, com um vestido verde limão, saltos altos, ficava quase da minha altura. Caminhamos por cinco minutos. Subimos uma escada estreita, que dava direto na porta.
– Por favor, não ligue pra bagunça
– Nem poderia – respondi.
Sentamos em um sofá marrom de três lugares, ela cruzou as pernas, bebia e fumava, eu abri as pernas e me escorrei no sofá, falando o mínimo.
– Então você realmente acha que tenho cara de puta? Perguntou e tragou o cigarro.
– Completamente. Todo seu jeito é de puta. Vai me dizer agora que é puta?
– Quanto você pagaria por mim hoje?
– Hoje nada. Mas se me pegasse ontem, uns R$ 18,00.
– Hahaha.
Cheguei mais perto dela, cheirei seus cabelos, seu pescoço, e subi cheirando, suas orelhas, suas bochechas, até que a beijei com certa violência. Aí não pude evitar o desapontamento inconsciente, mesmo alterado. Como uma mulher daquela idade, quase seus 30 anos não sabia movimentar os lábios o mínimo que fosse? Ela era boa demais de corpo, já devia ter beijado mais de quinhentos homens, e como não tinha adquirido qualquer habilidade? Segui na luta pra encontrar sua língua, em vão, não sei onde à escondia. Parei de beijar, encarei seus olhos e disse:
– Cadê sua língua?
– Tá aqui! Mostrou como se eu fosse o Zé gotinha
– Então porque não coloca ela dentro da minha boca?
– Eu coloco
Pensei que eu pudesse estar bêbado, e não sentisse nada. Tentei de novo, enfiando a minha língua tão fundo que temi a fazer vomitar. Um mulherão daqueles, mas com um beijo de peixe-espada. Já que o beijo não era o dos melhores, descartei qualquer preliminar e fui puxando suas roupas rapidamente. Isso ela fazia com maestria, em menos de quinze segundos estava pelada. Tirei minha roupa também, demorei uns dois minutos porque meu cinto enroscou numa almofada. Começamos no sofá mesmo, “Fode tua puta, vai”, “Vou te pagar a base de pepino no rabo”, “Fode tua puta, vai”. Depois de quatro minutos fomos até a cozinha, ela se pendurou na geladeira, coloquei-a de costas, pra evitar qualquer beijo. Acabamos gozando na cama e por lá ficamos um tempo. Ela quis trocar umas carícias, ficar abraçados.
– Eu te trouxe aqui, mas não queria dar pra ti.
– Queria o quê?
– Tomar umas, dar uns beijos apenas.
– E por que mudou de ideia?
– Nunca pensei que você beijasse tão bem, me fez querer.
– Que bom que quis.
Meu beijo não era nada daquilo que ela falava, era normal, para algumas mulheres até abaixo do esperado. O sexo poderia ter sido sofrível, eu suporto um sexo mequetrefe, até porque sou especialista em não satisfazer algumas mulheres, sem contar que o sexo pode ser melhorado com a insistência e prática das próximas vezes, já o beijo fica difícil, nunca melhora. Perdi um pouco da vontade de ficar, mas ficaria pela bunda.
– Ramon, me conte algo a mais sobre você
– Já viu o tamanho do meu amigo, o que precisa mais?
– Aaaaaa….pros homens tudo é pênis e vagina. Fique sabendo que as mulheres se interessam por tantas coisas mais, você nem imagina.
– Bem, nesse caso é conveniente que as mulheres conversem entre elas essas coisas, não?!
– Aaaa, me conte algo….
Seu telefone tocou, era perto das duas da madrugada.
– Alô…O que?….Onde está?…To indo aí, me espera!
Largou o aparelho.
– Vou ter que sair, minha prima me ligou chorando, tá desesperada em casa sozinha.
– O que houve?
– Não sei.
– Posso te esperar aqui?
– Não. Pode voltar amanhã?
Despedi-me com um selinho na testa, peguei uma garrafa na geladeira pra caminhada e agradeci a Deus por existirem mulheres que se contentam com pouca coisa. Prometi voltar no dia seguinte e foi o que fiz. Sabia que renovado nem ligaria pra beijo nenhum, desde que tivesse umas geladas e dois bicos de tetas disponíveis. Duas horas da tarde apareci lá.
– Pensei que não viria
– Tem outro aí?
– Não, não, pode entrar
Mais um beijinho na testa
– Trouxe umas cervejas, vou colocar gelar.
– Eu comprei umas e as que sobraram de ontem já estão geladas. Abre uma pra nós.
– Claro
Foi sentar no sofá.
Na noite anterior nem tinha reparado, sua casa era enorme. Não lembrava no que trabalhava, mas certamente havia me dito. Embora lembrasse de estar metendo nela apoiada no sanitário, se precisasse ir ao banheiro, teria que perguntar onde ficava.
A geladeira estava cheia de porcarias e restos de bolos, de presunto defumado e de queijo fatiado, algumas frutas, uns tomates congelados, cenouras grossas demais para salada, e uns potinhos embaçados, não dava pra distinguir o que eles escondiam. Um sanduíche até que cairia bem, mas peguei uma cerveja e fui para a sala sentar no sofá. No corredor tinha muitas portas, não entendia porque uma mulher sozinha precisava de tudo aquilo.
Ela não transparecia a idade que tinha, não naquele momento, aparentava uns 24. A maquiagem a deixava com uma cara mais velha. Enchi os copos e olhei pro seu decote prensado.
– Belas mamas – eu disse.
– Você apertou forte ontem, estão doendo.
– Não é sempre que consigo uns pra apertar, então aproveito os que aparecem.
– Eu não consigo ficar um mês sem sexo, fico maluca
– Eu sou como uma rematrícula de universidade, a cada seis meses. O que aconteceu com sua prima ontem?
– Nada não, só frescura. Vem aqui me dar um beijo
– Claro
Cheguei perto e dei-lhe um beijo murcho, pra combinar com o dela.
– Ontem você não me beijava assim Ramooon.
Ela lembrava meu nome. Eu só sabia que o dela começava com B ou D.
– Preciso ter bebido mais para beijar daquela forma. Vamos beber
– Me dá aquele beijo de ontem, que me fez pegar fogo e me dar inteira pra você
– A cerveja vai esquentar
– Me beija agora!
Larguei a cerveja e beijei com tanta força que a menstruação podia ter descido na hora.
– Ai que delicia.
Fiquei excitado com sua cara de puta. Tirei seus peitos pra fora e comecei chupar. Tirei o pau pelo zíper e mandei chupar. Abocanhou só a cabeça e ficou por ali quase imóvel, eu que tive de mexer sua cabeça pra baixo e pra cima. Sabia que da sua boca não podia esperar nada de mais. Sem língua pra mim, de qualquer forma.
Tirou a roupa, dessa vez em uns dez segundos cravados. Nem tirei nada, só abaixei as calças até os tornozelos e permaneci sentado.
– Quero sentar de costas, olhando pro espelho
– Senta então.
Seu traseiro aumentava consideravelmente de tamanho quando ela descia com as pernas afastadas.
Foi uma foda rápida, mas bem intensa. Com a bunda ela mandava bem, rebolava certinho. Nem tentei atrasar a porra, ela se contentava com pouco mesmo.
– Gostou Ramooon? Perguntou ainda comigo dentro
– É bom gozar
– Depois te faço gozar mais.
Lançou-se pelada no sofá. Ergui as calças, a cerveja havia esquentado, fui trocar por uma gelada e voltei.
– Ramon, seu beijo é o melhor que já provei
– Antes de mim beijava o que? Lâmpadas?
– É sério, você me deixa louca
– Olha só, meu beijo é normal, não tem nada de mais. Talvez seja os tamanhos de nossas bocas que combinem.
– Pode ser. Uma vez fiquei com um cara que beijava muito mal. Acabei dando pra ele, fiquei com pena. Me arrependi. Depois que ele gozou, me mandou embora da casa dele. Falei: “Nem precisa me mandar, teu pinto é mais frouxo que teu beijo”. Me chamou de vadia, na saída risquei o carro dele com minha chave, da porta até o pneu.
– Que violenta, ainda bem que deixei minha bicicleta em casa. Quer cerveja?
– Quero, mas antes um beijinho
– Preciso ir ao banheiro, já volto.
Sai andando procurando o banheiro. Era no final do corredor, última porta. Alguns chicletes chupados coloriam a pia, verdes, vermelhos e amarelos.
Voltei e ela tinha colocado a calcinha. Aquela visão me balançava.
– Cadê meu beijo?
Dei um beijo e sentei.
– E então, por que uma casa tão grande se mora sozinha?
– Eu gosto de espaço. De ter vários lugares para dormir. Às vezes eu me imagino em um castelo, como naqueles filmes, eu sou uma rainha, que só come e dorme.
Passei a garrafa em seus mamilos, ergui sua calcinha e dei uma lambida na pomba.
– Sinto lhe dizer, mas está fodendo com um bobo da corte.
– Tudo bem. Já fodi com príncipes pouco valentes. Tem vezes que sinto solidão, mas em um lugar menor também sentiria.
– Entendi.
Silêncio. Dei mais um gole.
– Faz tempo que mora aqui?
– Você fez essa pergunta três vezes ontem.
– Só confirmando.
– Aposto que nem meu nome lembra.
– Começa com B ou D.
– Você é fogo mesmo. Vou no banheiro.
Saiu rebolando, com a calcinha puxada mais para a nádega direita, coisa linda. Procurei alguma xícara com nome, ou um quadro, mas não achei.
Quando ela voltou, parecia mesmo uma rainha recém saída do trono.
– Que tal irmos pra cama? Sugeri
– Vamos
Fodemos pra valer dessa vez. Puxava seus cabelos loiros até o começo da bunda e galopava naquela égua.
– AI QUE PAU GOSTOSO, AI QUE PAU GOSTOSO.
E eu me sentindo o mais heroico dos reis, como se estivesse em um campo de batalha, duelando e ao mesmo tempo comendo minha égua guerreira. Quando gozei, pensei que tinha estourado algo por dentro do meu caralho.
– Me beija.
Dei-lhe um beijo totalmente satisfeito. Dormimos umas duas horas, só acordamos por conta do seu telefone.
– Alô – atendeu.
– Sim….Vou ficar em casa….Tá bom….Pode vir..
Desligou.
– Ramon, minha prima está vindo aqui, melhor você ir pra casa.
– Por quê?
– Não quero que ela te veja.
– Por quê?
– Porque temos assuntos sérios pra discutir.
– E a cerveja que sobrou?
– Pode levar se quiser.
Coloquei todas em uma sacola e fui saindo.
– Vem aqui se despedir.
Fui até ela, enfiei o dedo o mais fundo naquele rabo e soquei a língua num poço de nada.
Pensava: seria B de beijo ou D de desgosto?
Dois dias depois recebi uma ligação.
– Oi Ramon, tudo bem?
– Tudo e você?
– Tudo bem. Estou aqui em São Paulo, vim resolver uns problemas familiares. Vou aproveitar pra ficar com minha mãe um tempo. Voltarei daqui uns vinte dias, e a primeira coisa que quero fazer é te beijar por horas.
– Tudo bem então. Nos falamos.
– Ah. E meu nome é Bruna, seu perturbado dos infernos.
– Viu só, estava em dúvida se era com B de boneca ou D de delícia. Ainda chegaria lá.
– Hahaha. Tá bom. Beijos molhados. Me espera.
– Espero ansioso.

“Beijos humildes e um toque no reto”

Por favor Deus

Por favor Deus
Mate-a depois de mim
Carregue-a como um anjo, para dentro da sua fortaleza, onde apenas os justos caminham
Por favor Deus
Aprenda amar como ela
Castigue todos os homens do mundo como ela fez comigo
Os desacreditados necessitam reviver a eternidade
Por favor Deus, sente-se ao seu lado
Guarde sua alma
Onde as pessoas simplesmente boas não possam vê-la
E tatue nas costas seu nome
Pois a luta que lhe deu
Nem você venceria