a mesma mulher

“arruinei minha vida
casando com a mesma mulher
duas vezes” – disse
W. Saroyan

ouvi e digeri. marquei a página
tatuei o poema, e mesmo assim
acabei ludibriado
novamente
arriscando-me no mesmo fogo
na mesma chuva
ácida, pelo mesmo desejo
imponderável de viver
e sofrer – consequentemente

“sempre haverá alguma coisa
para arruinar nossas vidas?”
que vidas arruinadas são normais
eu sei, sou prova
mas quantos arruinados
otimistas
você conhece? sábios
ou não?

já não sei o que ela quer de mim
já lhe entreguei meu fígado
meus rins
minha garganta
meus pulmões, meu sangue
o pior de mim já nem me pertence
parece estar todo concentrado
nela
que finge não me enganar
enquanto finjo não saber
que sou enganado
e fingimos tão bem
que a coisa toda até parece andar
perfeitamente bem
como se tudo fosse verdade
como se Saroyan fosse o único
de fato
à arruinar sua vida
duas vezes
com a mesma
mulher.

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