Caso 0001113 (2º depoimento)

– Jonas Bello?!
– Sim?!
– Está me ouvindo?
– Estou
– Sabe onde está?!
– Sei
– Sabe por quê?
– Sei
– Onde estava ontem?
– Aqui?!
– Antes daqui
– Matando o Cada
– Você não matou o Cada
– Não?!
– O que lembra de ontem?
– Travessas embutidas em um corpo de metal, risos efêmeros nas cascas dos ovos, a devassa sensação de absorver cianeto pelo rádio, longas planícies infestadas de carrapatos em cadeiras de rodas, luvas estendidas nos fios dos postes, coringas vendidos em trajes de festa, cimento carregado no bico do papagaio, velas acesas nos olhos das crianças, e por fim, um pedaço de papel de presente molhado no fundo do lixo.
– Jonas Bello, posso te chamar de Bili?
– Por que Bili?
– Seu apelido
– Por quê?
– Por conta da sua semelhança física com Billy Cativo, o último jogador de Damas ainda vivo
– Pode ser
– Bili?!
– Sim?!
– Consegue me ouvir?!
– Sim?!
– Encontramos uma carta em seu travesseiro hoje
– É?!
– Sim
– Qual naipe?
– Uma carta escrita, foi você?
– E agora?!
– Bili?!
– Sim?!
– O que lembra de hoje?
– Pequenos grãos vermelhos em manobras no globo da morte, peixes tatuando bigodes, manequins plantados de cabeça para baixo e regados com formol, arames farpados cercando o fogo, velório de um tigre japonês, fotografias dos monges consertando colchões com pé de cabra, por fim, uma frase de Oscar       
– Qual filme?
– Oscar, o poeta
– Qual frase?
– Que escolhe os amigos pela pupila. Mas eu escolho pelos ossos da face
– Bili?!
– Sim?!
– Já pode voltar a dormir

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