– Não gosto dos seus livros – ela afirma.
– Só escrevi um, e nem publicado foi. Você leu porque quis – eu afirmo.
– Já estou contando com esse que está escrevendo.
– Certo. Vai trepar ou não?
– Minha resposta vai definir o prosseguimento do conto?
– Não, direi que te comi de qualquer forma.
– Que sacanagem.
– Pois é, Fláv….
– Calado! Não quero meu nome nesse livro de bosta.
– Relaxa neném.
– Se pelo menos você soubesse me descrever, não me importo se usasse da paixão ou do ódio. Gostaria que minhas curvas e personalidade fossem expostas no papel com ardor ou coceira. Consegue me qualificar como Bukowski fazia com suas mulheres?
– Bukowski se deliciava nas pernas. E nós dois sabemos que suas pernas não são grande coisa.
– E não pode mentir como ele?
– Não. Nada que escrevo é mentira.
– Em seu primeiro livro não publicado a primeira frase é: “Essa é uma obra de ficção. Tudo nessas linhas são mentiras desorganizadas”. E há pouco não hesitou em afirmar que irá me comer nesse conto, sem comer.
– Ah, porra. Você enche o saco. É só mais um nome e tá aí pensando que vou arrancar sua peruca e fazer nascer cabelo.
– Você como escritor é um grande nada.
– E você como mulher é um grande homem.
– Seu primeiro romance é uma cópia mal feita e fajuta de Charles Bukowski com John Fante, por isso ninguém quer publicar.
– Sim e daí? Nunca ouviu a frase: Bons autores criam, gênios copiam?
– Nunca, e vindo de você soa trágico.
– De fato, tranqueira.
– Qual será mesmo o nome desse livro que está escrevendo?
– “Delírios com lágrimas e orgasmos”
– De onde tirou isso?
– De um caderno.
– Já ouvi isso em algum lugar. É cópia de quem?
– Não interessa.
– Vou pesquisar, tenho certeza que já ouvi.
– Puta merda, Bandini poderia muito bem ser o personagem do livro “Fome” de Knut Hamsun.
– Sim e daí? Você é uma farsa.
– Suas pernas são mais feias que as minhas. Pronto, já sei como começar: “As pernas dela eram mais feias que as minhas”.
– Está delirando, mas prossiga.
– “As pernas dela eram mais feias que as minhas”. Esse é o título, o começo, meio e fim.
– Fale um pouco das minhas nádegas.
– Vira essa bunda pra cá então, xarope.
– Assim?!
– Não. Fica em pé.
– Tudo bem. Minha bunda deitada não te inspira?
– Tua bunda deitada parece um repolho roxo.
– E agora? Melhorou?
– “As pernas dela eram mais feias que as minhas. Quando levantava e separava as nádegas com as mãos usando toda força possível, eu sentia vontade de jogar vinagre e sal pra comer o repolho roxo”.
– Nem separei as nádegas seu imbecil. Você é péssimo. Concordo fielmente com suas palavras em seu romance que nunca será publicado quando diz não passar de um dos piores escritores do mundo.
– Sim e daí? Vai embora. Cansei de você já.
– Não irei antes de terminar meu conto.
– Terminei já.
– Posso deitar?
– Faça o que quiser.
– Descreva meu rosto.
– “E o que dizer da sua face? Um legítimo repolho roxo”.
– Qual seu problema com repolho roxo?
– Sei lá, olho pra você e vejo vários.
– É sério! Adjetive meus olhos.
– “E o que dizer da sua face? Um legítimo repolho roxo. Seus olhos vivazes e alcalinos miravam exponencialmente o rogo das mais divinas alamedas secundárias da imaginação. Suas pupilas não me enganavam, eram sementes, sementes de repolho roxo.”
– Orelhas.
– “E o que dizer da sua face? Um legítimo repolho roxo. Seus olhos vivazes e alcalinos miravam exponencialmente o rogo das mais divinas alamedas secundárias da imaginação. Suas pupilas não me enganavam, eram sementes, sementes de repolho roxo. Nas orelhas um toque mágico, uma cartilagem tão suave que seus contornos pareciam algodão, algodão doce que desmancha ao primeiro toque de língua e adocica os dias de chuva. Os brincos se estendem envergonhados por tanta beleza, sequer humana…” Porra, preciso enfiar um repolho roxo aí no meio.
– Enfia então.
– “Nas orelhas um toque mágico, uma cartilagem tão suave que seus contornos pareciam repolhos roxos, repolhos roxos doces que desmancham ao primeiro toque de língua e adocicam os dias de chuva”.
– Nariz.
– “O nariz aquilino deixa em alerta meu pinto e meus ovos. E por falar nisso, minha glande é roxa, assim como os repolhos roxos”.
– Boca.
– “Sua boca brilha com o saltitar das palavras, como se minimizasse os trovões que expurga pelas cordas vocais paradoxais aos sentimentos internos brutos. Situada na esfera dos campos da perdição, avassala os corredores sonoros que temem o silêncio….” Me perdi.
– Não faz mal. Coloca teu repolho roxo aí.
– “Sua boca brilha com o saltitar das palavras, como se minimizasse os trovões que expurga pelas cordas vocais paradoxais aos sentimentos internos brutos. Situada na esfera dos campos da perdição, avassala os corredores sonoros que temem o silêncio dos repolhos roxos”.
– Não entendi nada, mas gostei.
– Eu entendi, mas não gostei.
– A solidão é minha parceira, sem ela me sinto sozinha.
– Essa frase é minha.
– Tua nada.
– Por que veio aqui?
– Sei lá, para uns beijos, uns toques, um pouco daquilo que chamam amor e eu chamo tempestade.
– Está roubando todas minhas frases.
– Não são suas. Olha só, ontem vi um amigo que se parece muito contigo. Estava mais louco que o Lobato.
– Se eu me parecesse comigo também estaria.
– Os traumas são tão constantes, que você esquece os antigos e passa a viver com os próximos.
– Já escrevi isso.
– Jamais.Você não é nada. É só um patife biltre.
– Obrigado.
– Por que sempre uma garrafa do lado?
– Porque escrever sem beber é como cagar sem cu. Falo por mim.
– Besteira. Você não é escritor.
– Porra mulher, pare de ser o chato do chato do piolho do cu do chato.
– No fim de tudo, tudo é descartável.
– Por isso acho que a vida é excepcional pra quem morre no parto.
– Minha autoestima foi embora com a masturbação.
– Não me admira. O que acha dessas três frases: “Um escritor de certa forma é um traficante. Nenhum obriga ninguém a comprar sua droga”, “Decidi que mataria todos que me incomodassem e me matei” e “Se em qualquer momento da minha vida eu depositar toda minha esperança em alguém, então podem ter certeza de que perdi a esperança”.
– Huuuummm. Porcaria.
– Tudo bem, concordo.
– Como ficou meu conto afinal?
– “As pernas dela eram mais feias que as minhas. Quando levantava e separava as nádegas com as mãos usando toda força possível, eu sentia vontade de jogar vinagre e sal pra comer o repolho roxo. E o que dizer da sua face? Um legítimo repolho roxo. Seus olhos vivazes e alcalinos miravam exponencialmente o rogo das mais divinas alamedas secundárias da imaginação. Suas pupilas não me enganavam, eram sementes, sementes de repolho roxo. Nas orelhas um toque mágico, uma cartilagem tão suave que seus contornos pareciam repolhos roxos, repolhos roxos doces que desmancham ao primeiro toque de língua e adocicam os dias de chuva. Os brincos se estendem envergonhados por tanta beleza, sequer humana. O nariz aquilino deixa em alerta meu pinto e meus ovos. E por falar nisso, minha glande é roxa, assim como os repolhos roxos. Sua boca brilha com o saltitar das palavras, como se minimizasse os trovões que expurga pelas cordas vocais paradoxais aos sentimentos internos brutos. Situada na esfera dos campos da perdição, avassala os corredores sonoros que temem o silêncio dos repolhos roxos. Comi”.
– Dessa forma medíocre termina o conto?
– Não. Termina o livro.
Estão muito longos, ando com preguiça de ler. Rs