A estrada de praia grande

Que tal voltarmos pela estrada de praia grande?

Naquele entardecer de domingo

ainda sem chuva,

onde a única coisa que passava pela minha cabeça era

compassar as batidas do meu coração com o andar de meus pés.

Pareceu um convite tão generoso,

tão verdadeiro,

que negá-lo soaria como um pecado.

E, por Deus, se todos esses meus pensamentos forem frutos de pecados que cometi,

peço humildemente:

me perdoe.

Após alguns KM daquele asfalto cinza,

como meu olhar – cinza,

que, de tempos em tempos, cruzava pelo espelho do automóvel,

e refletia toda frustração de quem não entende por que está triste.

Concentro-me então nas rotações do motor,

nas falas ingênuas de minha filha,

nas piadas peculiares da minha irmã (que só nós entendemos),

e no silêncio encantador de minha esposa que confronta aquele meu olhar triste com um sorriso levemente inclinado que costuma ser meu refúgio em dias cinzas,

como o asfalto – cinza.

Então o asfalto dá lugar a um chão de areia,

por vezes batido,

por vezes movediço.

Olho primeiro à esquerda,

como deve ser.

Vejo uma pequena faixa de areia, e a imensidão dor mar.

À direita, uma vegetação rasteira, sobre dunas de areia que pareciam não ter fim.

Essa é a estrada de praia grande!

Naquele momento onde o silêncio é o melhor adjetivo diante tamanha beleza,

não resisto e falo em voz alta:

Esse deve ser o lugar mais lindo que já vi!

Então não ouço mais as ingenuidades da Lara,

nem nenhuma anedota da Analu.

O que impera é o silêncio de

de quatro vidas,

ali interligadas por aquela beleza deslumbrante.

Agora falo em voz baixa,

quase como um simples pensamento:

Esse é um dos melhores momentos da minha vida!

Obrigado, estrada de praia grande!

Mas alguns KM olhando aquela imensidão e beleza fazem com que meus pensamentos comecem a acelerar.

Apesar de não gostar tanto de Legião Urbana,

nunca pensar em gotas d’água ou grãos de areia pareciam fazer tanto sentindo.

Toda aquela beleza se torna uma espécie de questionamento existencial,

não sei,

os sentimentos ficam confusos,

e agora penso apenas na minha irrelevância perante isso tudo,

e só espero que a estrada de praia grande não seja tão grande assim.

Qual o problema? Pergunta minha esposa,

Não sei, olhar pra tudo isso mostra quão pequeno eu sou, difícil explicar.

Por que você simplesmente não curte esse momento?

Não sei, acho que são os pecados…

Pecados?

Deixa pra lá…

Então o chão de areia

batido por vezes,

movediço por vezes,

volta a dar lugar ao asfalto.

Se acabava assim a estrada de praia grande.

Então, o que achou da estrada de praia grande?

É tão linda quanto cruel!

Acho que não era a resposta que aquele anfitrião tão generoso queria.

Mas o que poderia fazer?

Mentir seria mais um pecado,

E, por Deus, se todos esses pensamentos forem frutos de pecado que cometi, peço humildemente:

me perdoe,

me perdoe…

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